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Apresentação

Ora cá está!

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Há cerca de 9 anos comecei a decorar Os Lusíadas porque … não tinha mais nada para fazer …e também porque tinha umas contas a ajustar com o meu tempo do ensino secundário: sentia-me culpado por não ter gostado … e …

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Fui reescrevendo tudo, verso a verso, estrofe a estrofe, episódio a episódio, canto a canto, socorrendo-me da informação só para perceber a letra original e deixando que, a partir daí, explodissem as coincidências de sentido com o mundo e o tempo em que vivo, que os ritmos se manifestassem, que a brincadeira acontecesse, que a emoção jorrasse. Foram anos nisto. Às vezes sozinho, muitas outras com centenas de cumplicidades em contextos muito diferentes. Só queria fazer a falação de uma obra cuja escrita é tão intrincada. Cuja leitura é tão difícil. Queria reescrevê-la na fala, que é um sítio muito mais antigo de comunicação do que a escrita. E porque é esse o meu ofício: reinventar na fala, no corpo, ao vivo, o que foi escrito. Nesse sentido este é também um exercício sobre o meu ofício: nada se inscreve no corpo que não viaje por dentro, que não seja celular, que não tenha passado muitas vezes pelo coração, no incessante bombeamento sistólico, que não seja by heart, par coeur, de cor.

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Quando comecei não sabia nada disto, nem destas razões. Também não sabia que tenho cromossomas de alguém que foi naquela viagem, porque não foi só o Gama e mais meia dúzia, como sempre nos referiram, mas fomos todos. Todos fizemos aquela viagem de sonho e sofrimento. Não a fizemos todos ao mesmo tempo mas dos que sobreviveram nenhum escapou à visão do escorbuto ou à ameaça do Adamastor e todos passaram na Ilha dos Amores. E deixaram-nos isso nos cromossomas. Os fumos da Índia esfumaram-se, levaram-nos o vento há muito, mas Esta é a ditosa Pátria minha amada, ficou. Os Lusíadas, como sugere Hélder Macedo, é uma viagem iniciática, a que ninguém escapa. Fazemo-la individual e coletivamente e os tempos de cada uma podem não coincidir, mas ficamos marcados. Ouvir Os Lusíadas é como ver as fotografias da viagem e, quando vemos as fotos, de certa maneira voltamos a ir.

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É esta história que aqui se fala. Pela primeira vez na íntegra. Tudo o que não seja o embalo das palavras do contador não me compete a mim falar. E essas estão gravadas, para o bem e para o mal e esperam quem as oiça. Pôr-me aqui a justificar opções…Não menos é trabalho que grande erro/ Ainda que tivesse a voz de ferro.

 

Quero agradecer às centenas de pessoas que tornaram este trabalho possível, colaborando direta ou indiretamente na sua gravação e financiamento e que de modo nenhum estão todas referidas nos agradecimentos.

 

António Fonseca

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